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Construir estratégia de monitoramento viabilizando responsabilização e aprendizagem a nível de sistema

A política de monitoramento na saúde municipal exerce duas funções fundamentais: gera informações que permitem a responsabilização dos provedores e garante aprendizagem a nível de sistema. Mensurar bem possibilita que a gestão municipal aprenda com o curso das  intervenções feitas na realidade. Uma política efetiva de monitoramento possui três componentes que operam de maneira coordenada: 1) processo de coleta de informações preciso, eficiente e de alta frequência; 2) capacidade de criar análises que informem de maneira inteligível e recorrente todos os níveis da gestão e da provisão de serviços e 3) processos de tomada de decisões ancorado na utilização da evidência disponível.

Ações na prática e seus indicadores

A falta de integração entre os sistemas de informação que coexistem na saúde é um problema frequente. O uso de identificadores diferentes para cada cidadão gera duplicações, inconsistências e dificulta o acesso a dados sobre itinerário e linha do tempo de cuidado dos usuários. Alguns municípios possuem sistemas diferentes para cada bairro ou território programático, o que contribui para falhas na análise e exige muitos esforços na tentativa de integração dos dados. Unificar o sistema de informação das unidades com um único identificador individual é o primeiro passo para melhorar a qualidade, agilidade e efetividade do uso de dados municipais para informar a melhor provisão de serviços.

indicador: percentual de a) serviços e procedimentos; b) equipamentos que utilizam o mesmo identificador para o usuário

O sistema de saúde é caracterizado por sua complexidade e intensividade em transações: são prestados múltiplos serviços de naturezas distintas em diversos pontos de atendimento. Seria muito difícil coletar e analisar com eficácia todas as fontes de dados disponíveis.  Por isso, é fundamental que a gestão estabeleça indicadores prioritários a serem acompanhados ao longo de 4 anos, a partir do diagnóstico de necessidades de saúde e do funcionamento da rede municipal, de modo que a coleta qualificada desses dados seja obrigatória nos serviços. 

Essa proposta também leva em conta o nível de agregação dos indicadores, de modo que se permita a avaliação dos dados por território, por UBS, por equipe ou por profissional. Deve-se pactuar, também, a frequência de análise dos indicadores. Além da definição de qual o pacote mínimo de dados para os quais os municípios devem olhar, é importante pensar nas métricas de processos e métricas de desempenho que o município deve monitorar, por meio de um painel de controle.

indicador: definição do CMD e dos dados que integrarão o painel, e do percentual de indicadores que podem ser desagregados nos níveis definidos

Os painéis de controle não devem informar somente a alta gestão. Os profissionais da ponta investem boa parte do seu tempo na coleta de dados. A falta de um ciclo de aprendizagem que retorne os benefícios da análise desses dados para seu ponto de origem compromete o aprimoramento dos processos de coleta e a capacidade de melhoria dos serviços. Sistemas inteligentes de coleta de informações podem, por exemplo, reduzir espaço para erros de registro, bem como dar insumos para o trabalho de acompanhamento e encaminhamento de usuários.

Uma estratégia de monitoramento efetiva deve alinhar coleta, análise de dados e tomada de decisão:

Na coleta, é preciso treinar equipes da ponta e da assistência para assegurar a precisão das informações, garantindo que cada dado seja coletado apenas em um ponto da linha de cuidado, reduzindo o tempo
e o esforço despendidos neste processo.

Na análise de dados, é preciso construir capacidade estatística
para o processamento das informações em relatórios úteis e inteligíveis.
As informações devem ter a frequência (em geral, diária, semanal e mensal) e o nível de agregação adequados para a tomada de decisão em todos os níveis da gestão, podendo ser analisadas no nível dos equipamentos de saúde, dos territórios e das equipes de saúde.

Na tomada de decisão, é preciso capacitar profissionais para um processo decisório baseado em dados e também utilizar autoridade política para reforçar a construção de rotinas de monitoramento recorrentes em todos os níveis da gestão e da assistência.

indicador: proporção de equipes da assistência e da gestão realizando reuniões semanais de monitoramento dos dados

É comum, no contexto brasileiro, presenciar a reemergência de algumas doenças como, por exemplo, as arboviroses. Essas e outras situações mostram a importância de ter um monitoramento mais ativo de casos e fatores de risco para essas condições. De igual modo, a crise do coronavírus expôs a necessidade de pensar um controle mais estrito de casos confirmados e seus contactantes. As ações a serem pactuadas dependem da doença, mas podem incluir levantamento do índice de infestação por Aedes aegypt, mapeamento de sintomáticos respiratórios e inquérito sobre contatos, etc..

Quais problemas resolve

Passos para implementação da proposta

Realizar bom diagnóstico situacional da saúde municipal;

1

Identificar sobreposições de bases de dados e de processos de coleta e organização destes;

2

Priorizar a informatização das unidades de saúde;

3

Identificar sistemas e estratégias de captação de dados (de softwares a planilhas) e padronizar os usos e atribuições;

4

Avaliar a possibilidade de integração e automatização da extração de dados das bases já existentes;

5

Criar capacidade analítica de dados nas equipes de todos os níveis de gestão, por meio de treinamentos, por exemplo;

6

Identificar indicadores em comum e necessidades de um sistema de informação para padronizar;

7

Identificar responsáveis técnicos nas unidades para capturar e analisar dados;

8

Construir rotinas de acompanhamento de dados nos diferentes níveis de gestão;

9

Implementar rotina de matriciamento ou oficina sobre uso dos sistemas e indicação dos dados úteis, do nível macro para o micro.

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Desafios políticos e administrativos

Um desafio dessa proposta é a questão da informatização, que é um problema persistente em algumas regiões do país. A gestão municipal deve estar atenta às oportunidades de financiamento oriundas do Governo Federal, bem como a um plano de garantia de infraestrutura mínima, como sinal de internet e espaço físico para instalação de computadores nas unidades.

A proposta exige também mudança de rotina em todos os equipamentos de saúde e nos fluxos de processos decisórios. Outro desafio pode estar na contratação ou mudança de sistema informacional, o que impõe complexidade operacional e ainda resistência por parte de alguns atores. A concorrência para escolha de sistemas informacionais também pode estar sob grande influência política.

Endereçar essas questões exige um alto grau de compromisso político e de sensibilização dos atores envolvidos. É importante garantir espaços de diálogo com gestores locais e envolver os profissionais da ponta na construção de todas as ferramentas aqui propostas. Encontros e oficinas com metodologias estruturadas podem ser úteis nesse processo.

Estudo de caso

A experiência de seminários de gestão para garantir ciclos de retorno de dados para as equipes da ponta no Rio de Janeiro

No município do Rio de Janeiro, a Subsecretaria de Promoção, Atenção Primária e Vigilância em Saúde (SUBPAV), da Secretaria Municipal de Saúde, apostou em um modelo de seminários de gestão para dar retorno às equipes sobre seu desempenho (com base no painel de indicadores do município) e dar transparência às prestações de conta. A proposta era que as UBS realizassem, além da prestação de contas, uma autoavaliação, apresentando objetivos alcançados (ou não) no último ano, os desafios e gargalos encontrados e as propostas para a melhoria de desempenho. Vários atores participaram destes espaços, que era realizado a intervalos de tempo regulares e definidos: representantes da subsecretaria, gestores e profissionais da saúde, além de representantes das coordenadorias regionais e usuários. Posteriormente, a SMS associou um programa de certificação de qualidade (chamado CRCQ – Certificação de Reconhecimento do Cuidado com Qualidade) a estes seminários de gestão, de modo a reconhecer boas práticas.

Curitiba

Construir uma estratégia de monitoramento, viabilizando a responsabilização e a aprendizagem contínua, torna o sistema mais resolutivo e eleva a produtividade

Abaixo, descrevemos os mecanismos através dos quais essa proposta impacta positivamente o sistema de saúde, resolvendo os problemas especificados acima: 

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AÇÃO
Mecanismo/produto
Resultado
Impacto
• Instituir sistema de informação com identificador único por indivíduo
• Integração de informações de saúde a nível individual
• Redução de sobreposição de trabalho de integração e limpeza dos dados
• Gestão consegue acompanhar a trajetória dos usuários no sistema
• Menos tempo é necessário para melhorar a qualidade dos bancos de dados e mais tempo fica disponível para análise e planejamento
• Dados de melhor qualidade disponibilizados de forma mais rápida
• Serviços mais resolutivos
• Aumento da produtividade do sistema de saúde
• Instituir Conjunto Mínimo de Dados (CMD) e painel de controle municipal
• Gestão municipal monitora ativamente um rol delimitado de dados padronizados e de fácil acompanhamento
• Necessidade e efetividade de intervenções são identificadas de modo rápido
• Atores são corresponsabilizados e engajados nos processos de mudança
• Serviços mais resolutivos
• Aumento da produtividade do sistema de saúde
• Efetivar ciclo de análise de dados, com a informação voltando para a ponta
• Profissionais e gestores podem identificar pontos de melhoria e reconhecer intervenções exitosas na rede
• Profissionais entendem importância dos processos de coleta e isso produz novos sentidos no trabalho
• Gestão central se aproxima das dificuldades e desafios da coleta e processamento de dados na ponta
• Maior integração e proximidade entre alta gestão e o nível local
• Garantia de um ciclo de análise de dados e planejamento de intervenções de acordo com eles
• Cultura organizacional de aprendizado contínuo e de uso de dados é firmada nos serviços e na gestão central
• Serviços mais resolutivos
• Aumento da produtividade do sistema de saúde
• Implementar plano de monitoramento para doenças de maior interesse sanitário
• Gestão consegue identificar, em tempo oportuno, aumento de casos de doenças reemergentes e outras condições de interesse sanitário
• Gestão e serviços conseguem planejar e atuar de modo mais preventivo/ de contenção, evitando surtos e sobrecargas no sistema
• Serviços mais resolutivos
• Redução de incidência de doenças reemergentes e redução de desfechos negativos ligados a elas)